CHOCOLATE
Rio,13/11/2016
Eu nasci branca, muito branca e neta de um avô negro, com tios mulatos, primos brancos e negros. Por toda vida que eu tive e por quanta me restar na terra, vou ser contra o racismo, vou ser contra todo e qualquer conceito que não veja um ser humano apenas como um ser humano. Tem horas que chego a questionar porque Deus permitiu que houvesse a escravidão dos negros, porque cargas dágua o mundo teve que passar por esse período assustador da história que deixou ranços que mesmo 128 anos depois de extinta, ainda expõe suas cicatrizes na sociedade.
Não foi apenas no Brasil que houve esse vergonhoso período do mundo em relação aos negros, assim como não é só no Brasil que eles ainda lutam por igualdade. Esta semana eu postei as recomendações sobre o filme Bem-vindo a Marly-Gomont que abordava questões raciais na França de 1975, pois agora tenho uma outra recomendação que aborda de forma mais tensa e dramática, questões raciais na França de 1800, mas eu diria que seria no mundo de 1800.
Seu nome de batismo que quase 99% das pessoas não faziam ideia era Rafael Padilha nasceu em Cuba em 1868 e foi vendido como escravo de lavoura quando ainda era criança. Anos depois ele consegue fugir e é encontrado nas docas na Espanha pelo palhaço Footi que o coloca nas suas apresentações, ele passa então a ser conhecido como Chocolate e vivem num circo ambulante recebendo trocados até que recebem a proposta de irem para França se apresentar num famoso Circo/Teatro de Paris.
Chocolate era negro e escravo fugitivo, inacreditável esta realidade num mundo que já utilizava carros e luz, mas no Brasil na mesma época de 1880 também tínhamos escravos e carros. Como escravo fugido ele não tinha certidão de nascimento nem documentos, e não fazia diferença para o trabalho porque era Footi que fazia as negociações e assinava as papeladas, Chocolate era só o negro em cena.
Festeiro, esbanjador, viciado e mulherengo demorou a cair em consciência de que era um negro fingindo ser branco numa sociedade que fingia aceitar sua presença e de vez em quando mostrava toda sua ira com sua presença. Chocolate que se relacionou com muitas mulheres ( brancas ) uma hora conheceu uma mais letrada , mais fidalga que começou a lhe despertar o desejo de ser reconhecido por seu talento próprio e não apenas pelo negro de estimação de um palhaço famosos do passado, e , ele tenta!!!
O historiador francês Gérard Noiriel escreveu no ano de 2012, uma biografia sobre Rafael Padilha-Chocolate (1868-1917) e o diretor Roschyd Zem transformou num belo e incomodo filme a incrível história deste homem que até 2012 não era conhecida.
A trama começa leve e divertida e vai aos poucos assumindo seu aspecto tenso e feio de mostrar a sociedade branca e racista que tratava não apenas negros, mas
como qualquer ser humano de outro continente que não fosse a Europa como animais de circo ou de zoológico. Há uma cena repugnante em que mostra uma exposição de seres humanos das colônias francesas mundo à fora com catazes para que não os alimentem e é nesse momento que Chocolate tem seu 1o confronto da realidade lhe cobrando uma postura de homem negro e não uma mera diversão da burguesia branca e rica de Paris, a cena é de forte impacto pra quem como eu, é de origem ( com muito orgulho) negra. Algumas pessoas me perguntam porque eu não ostento com tanta pompa e orgulho meu lado português da família mas falo a todo momento do meu avô negro. Porque sinto vergonha do que os
portugueses fizeram com essa terra e sinto a dor do que os negros passaram, sempre digo que se esse lance de vidas passadas for verdade eu fui uma negra gorda, forte e lutei até o fim contra a escravidão e a hipocrisia católica de matar um negro na porrada e ir a igreja rezar pra Deus.
Voltando ao filme, Omar Sy é o nome do ator escolhido para fazer Chocolate, ele é um homem forte e muito grande, porém nos achados que fiz pesquisando, o Chocolate da vida real era pequeno e comum, mas é apenas um misero detalhe porque Omar está esplêndido nesse papel, fora de que ele é liiiiiiiiiindo, noossa eu queria rs rs rs
O que eu gostei nesse filme foi mostrar que os conflitos raciais de hoje são menores do que os do passado e isso nos da esperança de que um dia o mundo vá definitivamente não ter mais diferenças raciais, no filme se preserva a humanidade dos 2 amigos e mostra situações ode claramente são legais e não tão legais um com o outro, um erra e acerta o outro também, porque são humanos e como tais , erram e acertam , não importa que sejam branco e negro, o filme mostra suas qualidades e defeitos ... humanos.
Tem horas que tive raiva de Chocolate e tem horas que tive raiva de Footi como também senti pena , compaixão de um e de outro. Infelizmente essa pérola do cinema Frances não esta na Netflix nem no NOW, terão que achar pra ver, mas espero que achem e que vejam porque de fato é um filme que não pode deixar de ser visto. Que pena que o mundo só tomou conhecimento de Chocolate em 2012, mas ainda bem que tomou, RafaelPadilha/Chocolat é considerado o maior palhaço negro da história. O filme está sendo aclamado por critica e publico e eu achei uma obra prima.
CHOCOLATE
Lançamento 21/07/2016
Direção: Roschdy Zem
Elenco: Omar Sy, James Thiérrée, Thibault de Montalembert mais
Gêneros Biografia, Drama
Nacionalidade França
Simone Coutinho e Santos
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